O dia amanheceu fresco, mas rapidamente percebemos que se iria tornar soalheiro, como de facto aconteceu. Com uma certa brisa, porém, o que por vezes constitui um bálsamo para quem resolve caminhar em Julho… Pelas 8,45h, já os participantes da zona do Porto se encontravam em Leça do Balio, no local previsto para o fim de percurso e realização do piquenique, aguardando a chegada do autocarro fretado pelo “pessoal de Viana” (uma opção que se revelou acertada), o qual nos haveria de transportar, a todos, até ao ponto de início da caminhada, em Santa Cruz do Bispo. O percurso pedestre teve início nas cercanias do velho moinho “Moleiro da Silva” – ou o que dele resta – seguindo pela margem esquerda do rio Leça, numa primeira extensão com cerca de um quilómetro, ainda não intervencionada e que, por esse motivo, acaba por se revestir de um certo encanto bucólico, com forte arborização, antigos moinhos, açudes, até chegarmos à Ponte do Carro, uma bela e elegante ponte medieval, em cavalete, com um amplo arco de volta perfeita. A partir daqui continuamos (quase) sempre junto ao rio, mas já pelo recentemente criado “Corredor Verde do Leça”, um projecto ambiental e de mobilidade envolvendo os municípios de Santo Tirso, Valongo, Maia e Matosinhos. Junto ao Monte de S.Brás, na margem direita do rio, fizemos um pequeno desvio, a passar pelas capelas de S.Sebastião e de N.ª S.ª do Livramento e S.Brás, antigo lugar de romaria, para visitarmos o curioso conjunto escultórico denominado “Homem da Maça”, onde, cumprindo o que reza a tradição popular, os caminheiros tiveram uma oportunidade para formular os seus secretos desejos… Depois de passarmos sob a VRI, e uma vez retomado o percurso normal, chegámos à ponte medieval de D.Goimil, pertencente à antiga via romana que ligava os rios Douro e Ave. Durante o reinado de D. Afonso III, era conhecida como Via Veteris (estrada velha) sendo, na época, a mais importante ligação entre Porto e Vila do Conde. Um pouco adiante, passagem no local onde se deu o tristemente célebre “desastre de Custóias”, o maior acidente ferroviário ocorrido em Portugal, o qual, em 1964, custou a vida a cerca de uma centena de pessoas. O dramático acontecimento, conforme referido pelo Celso Pontes, acabou, nessa altura, por estar na origem da criação do Serviço de Urgência do Hospital de S.João. Chegados à Ponte de Moreira, uma breve paragem no respectivo parque, junto ao rio, para retemperar forças. Continuando, agora em definitivo, pela margem esquerda, passamos junto da ponte de Ronfos, pertencente à antiga estrada que ligava Porto a Ponte de Lima, e cuja construção remonta à época romana. Sofreu diversas reconstruções ao longo dos tempos e pouco resta da estrutura original. No entanto, para satisfação de alguns, foi ainda possível “descobrir” e identificar algumas (poucas) pedras que foram reaproveitadas da primitiva ponte romana – as genuínas! Com a chegada à zona da Lionesa – outrora uma das mais notáveis empresas têxteis do país, hoje um espaço constituindo o maior polo empresarial de Portugal – a caminhada aproximava-se do seu termo. Tempo ainda para admirar dois magníficos exemplares de Arte Urbana: o primeiro, na parede exterior do armazém Super Bock Group, da autoria do célebre artista Vhils e da dupla espanhola PichiAvo, sendo um dos maiores murais, deste tipo, no mundo; o segundo, o Mural da Lionesa, de aproximadamente 1400m2, localizado na Rua da Lionesa, num muro pertencente à Unicer, resulta da participação de dez artistas, alguns de renome internacional, que, em 2014, se juntaram para uma intervenção que retrata muito da história de Matosinhos, a evolução da Lionesa e o processo de produção da cerveja, proporcionando uma expressão visual completa. Aqui, e por um feliz “acaso”, encontramos a Arquitecta Paisagista Laura Costa, autora do projecto “Corredor Verde do Leça”, de que tínhamos vindo a usufruir – uma boa oportunidade para um breve diálogo sobre alguns aspectos relativos a esta obra. Enfim, chegamos ao local do piquenique – o Parque das Varas. Mas…surpresa, talvez fruto de um fim de semana com bom tempo anunciado, a sobreposição, neste dia, com a iniciativa pública Open House, a qual também incluía as visitas ao Mosteiro de Leça do Balio e ao Corredor Verde do Leça, o facto é que as seis mesas “de pedra” aí existentes e que, ingenuamente, esperávamos encontrar livres… estavam ocupadas com outras gentes e seus copiosos farnéis! Sem problema, nada que atrapalhe caminheiros de montanha, habituados a repousar em qualquer recanto, faça chuva ou sol. Uma sombra fresca, um chão relvado, e eis que sobre as toalhas já estendidas começa a pousar uma infinidade de variados e apetitosos petiscos, como só estes amigos VianaTrilhos sabem inventar, neste caso, dignos de um verdadeiro fecho de temporada! Nem faltou o café, feito na hora, pela Sameiro, a Júlia e a Manuela, a lembrar os nossos amigos ausentes Lúcia e Cocas, cujo regresso ao nosso convívio aguardamos, o mais breve possível, pois fazem falta! E faltam palavras para o excelente vinho do Porto, qual chave de ouro, com que nos brindou a Conceição Fonte! – perdão, corrijo: Porto é o que se compra nas garrafeiras; neste caso, designa-se GENEROSO, que é quando provém de Amigos, para outros Amigos. Quanto mais haveria a dizer… O importante são, de facto, as pessoas e os bons momentos gerados pela amizade que as une, como aconteceu, a meu ver, nesta tarde de sábado, junto ao rio Leça. Acabamos por não ir à Ponte da Pedra (faltavam uns 500 metros, acho que ninguém reparou!) mas, olhando a descrição que Helder Pacheco fez em 1986 – leiam o folheto da nossa caminhada – a realidade presente, embora com alguns ganhos, não se alterou substancialmente… Mas faltava ainda o prato forte cultural: a visita à Igreja de Santa Maria de Leça do Balio e ao Mosteiro/Fundação Livraria Lello. Da surpreendente igreja, entre outros aspectos, importa reter: a figura de Frei Estevão Vasques de Pimentel, a cuja acção visionária se devem as profundas alterações no Mosteiro, ocorridas no sec. XIV, sem esquecer o belo e significativo epitáfio, em placa de bronze, junto do seu túmulo; e as obras do escultor Diogo Pires o Moço, figura maior do Manuelino, trazido pela mão de Frei João Coelho, nos primeiros anos do sec. XVI. Se a visita à Igreja era livre, a do Mosteiro coincidia com as visitas no âmbito da iniciativa Open House. Todavia, porque previamente acordado, foi-nos concedido um tratamento especial, e acompanhados pela Rita Marques, da Fundação Livraria Lello, tudo decorreu sem constrangimentos. Oportunidade para observar a intervenção do Arq. Siza Vieira, quer nos espaços que, do antigo mosteiro, chegaram até aos nossos dias, quer no novo edificado, que o mesmo apelidou de Templo, uma estrutura de forte carga simbólica, com cerca de 400m2, em betão branco, albergando, a céu aberto, uma escultura em mármore, com dois metros de altura, também por ele criada – o Peregrino. Falsa ruína recortada no céu, evocando o passado? Nova Capela Imperfeita? O Tempo o dirá…
Fernando Barroso
Informação sobre os aspetos mais significativos:
Data | 2024-07-06 |
Hora de início | 9:45 |
Hora do fim | 14:00 |
Tempo total do percurso | 4h 15m |
Velocidade média deslocação | 3,24 km/h |
Distância total | 13,45 km |
Nº de participantes | 40 |