2012-05-19 Pelas cambas à Ermida e Bilhares

VIANATRILHOS NA SERRA AMARELA

 

Pelas cambas à Ermida e branda de Bilhares, este grupo caminhou, sempre com a serra à vista e será, porventura, o que melhor conhece as brandas do Alto Minho. Por estas bandas e brandas pedalaram os Rampinhas (btt), em finais do século passado (!), alguns integrados no Vianatrilhos, como é o caso do Miguel e do Zé Almeida, só para referenciar os destacados caminheiros que devotam o seu tempo de lazer em prol de outros que gostam de caminhar e encontram tudo feito. Uma severa repreensão vai bater à minha porta por esta inusitada alusão, mas não poderia calar a experiência, camaradagem e companheirismo deste dueto, o seu a seu dono, ou melhor, a César o que é de César!

Andamos por terras da Nóbrega, assim conhecida Ponte da Barca, até alturas do sec xv, terra natal dos irmãos poetas, frei Agostinho da Cruz e Diogo Bernardes, cujo ponto geográfico mais altivo é o Coto do Muro, com 1361 m, na Louriça, em plena serra Amarela, aquela que não vem no mapa e se reveste das lindas cores verde e amarela e nos separa do Gerês, do distrito de Braga e do Baixo-Minho.

A pontualidade marcou o arranque das viaturas na direcção de Entre Ambos – os - rios e em Lourido foram estacionadas, para início desta caminhada. Descemos ligeiramente para o rio Froufe que nasce na serra amarela e por entre corgos e fragas vai desaguar de mãos dadas com o Carcerelha no rio Lima, que os romanos chamaram de Lethes.

Quando morria alguém na Ermida, os funerais seguiam pelas cambas, quando o único trajecto se fazia por aqui até ao cemitério, que jazia no sopé, em que os acompanhantes se faziam transportar de comes e bebes e, em bancos de pedra adrede colocados ao longo do caminho, descansavam, comiam e bebiam…era mesmo uma cambada das antigas!

Os Rampinhas definiam estas cambas do seguinte modo “carreiro de pé posto que, em torcicolos vai subindo o espinhaço do monte, por vezes talhado em degraus na rocha lisa. Por aí se faz (fazia), a dorso de muar ou de gente, todo o intercâmbio comercial…”

Lá atravessamos nas empondras do Froufe, rio para lá, rio para cá, com quedas de arrepiar qualquer truta, até que apanhamos o trilho original, outrora bem demarcado e limpo de vegetação e por onde passavam os carros de bois reduzidos no tamanho e típicos desta aldeia. Na subida, as giestas abafavam a urze e o tojo, escondendo o carreiro e dificultando a caminhada. Quanto mais subíamos, mais as giestas atrapalhavam a escalada, havendo necessidade de romper o caminho com as mãos…se a catana do Pimenta funcionasse, não havia necessidade…e para azarar o esforço dos caminheiros a chuva não se ficou pela ameaça, passando à molha efectiva, ainda que transitória.

Chegamos ao alto da Ermida, a mais sertaneja de todas as aldeias de montanha desta serra, de cara lavada e ruas empedradas, ladeadas de casebres de pedra solta e tosca, em tempos idos cobertas de colmo, a cheirar a rosmaninho e giesta à mistura com aromas das cortes dos animais; atravessamos esta vetusta aldeia, onde o saneamento e a luz, digo, electricidade, tardaram a chegar, coisas de tempos modernos; quase não vimos pessoas, era meio-dia, hora da janta para quem se levanta cedo, e nós, com hábitos citadinos, do facto estranhamos, mas a vontade de chegar à branda de Bilhares para piquenicar tornava-se evidente.

Acabamos por empreender toda a potencialidade física de caminheiro destemido para vencer a encosta de acesso à branda, pagando bem caro a aventura do mais difícil; por aqui foi encontrada a pedra dos namorados e são patentes os vestígios arquitectónicos de ocupação castreja. Idêntica a tantas outras, a branda de Bilhares constituiu segunda habitação para o pastoreio e cultivo nos meses de veraneio, aliás, típico da transumância das populações serranas, regressando à aldeia ou brandas de inverno (inverneiras), em zonas mais baixas, nos meses de Outubro a Março.

O rio Froufe, a descer em catadupa por entre fragas há milhares de anos, vai esculpindo nas rochas e cantando por entre carvalhos, bétulas e freixos, com a serra Amarela de vigia lá bem no alto, e nós a subir, penando entre tojo e carqueja, até que Bilhares nos apareça, para sossego das pernas tremulantes, finalmente! Aqui, com o apetite de um prato suculento e um bom vinho verde, o desejo de muitos, caía que nem mel na sopa, mas tiveram de se contentar com o panorama rústico envolvente e agarrarem-se a um filete ou patanisca.

Nuvens negras apressaram a descida para a Ermida, quando se dá a reunião do grupo porque a inglesa veterana e vegetariana Louise fazia anos e junto a uma destelhada casa da branda cantamos os parabéns, com pulmões de montanha, notando-se alguma emoção na sua frieza de temperamento.

A visita ao café do Carvalhal, outrora mais tasca, não podia faltar. O afamado invisual tocador de concertina, com renome além-fronteiras, proporcionou a todo o grupo a audição de três modinhas de folclore. Em jeito de debandada, demos uma olhadela, passe o termo, ao museu e nele pudemos ver num espaço envidraçado os pré-históricos exemplares da estátua menhir que serve de símbolo heráldico ao brasão da Ermida e a tal pedra dos namorados, a par de alfaias agrícolas que nos anos cinquenta do século passado (XX) eram instrumentos de trabalho.

Aprontamo-nos para descer, porém, a foto geral junto à placa turística da Ermida foi tirada e ali ao lado a imagem da senhora do mesmo nome parecia abençoar quem a esta terra vem, mas a descida em paralelo e asfalto até Lourido acabou por aquecer as solas do calçado, com 16 Km andados.

Cá em baixo na povoação, na aproximação dos carros, o Rego alertou para uma placa inscrita na parede de um edifício que dizia “casa da comenadeira”, curioso título que nos deixa sem saber o que pode significar, e mais à frente repara na talha de uma porta de espigueiro com motivos célticos (?). Na hora da despedida, a dispersão é fatal, de regresso a penates, uns vão pelo “27” em Ponte de Lima e outros seguem um rumo mais caseiro, porém, em Lavradas, a viatura do Abreu, que transportava o Carlos, Miguel e o Luís, resolveu parar junto ao restaurante “O companheiro” – telefone nº 258455255, por falta de combustível (!).

Bendita a hora que tal aconteceu, porque estávamos na terra natal do Abreu e de conversa em conversa acabamos por saber que se tratava de restaurante gastronomicamente creditado, ao que parece, desde os rojões ao cozido à portuguesa (o Meixedo não gosta de cozido…), à posta barrosã com arroz de feijão malandro, pica no chão ou bacalhau assado, com vinho da monocasta vinhão da zona, é de recomendar e ser encomendado, em que o “iva” a pagar por pessoa ronda, por excesso, a “décima” em euros do imposto devido.

Ponte da Barca é terra de comer bem, sendo a posta barrosã com arroz de feijão malandrinho o prato “ex-libris” regional, do vinho nem vale a pena falar. Mas, já que abordei o vinho de Ponte da Barca, ou melhor, da adega cooperativa, podemos escolher o branco ou tinto, branco meio seco, branco loureiro, Terras da Nóbrega branco e tinto e, ainda, aquela que foi a grande aposta da adega: o tinto vinhão, com a sua cor intensa e a envolvência do aroma. Para finalizar este cabaz, a aguardente velha da adega é de excelência, obtida a partir da destilação do vinho verde das casas regionais, depois de um longo processo de envelhecimento em cascos de carvalho.

Dou por fim todo este arrazoado, recordando a máxima local: quem faz amor na Ermida fica preso toda a vida…mas sempre pensei que o tradicional era quem bebesse da água é que casaria na Ermida…eu bebi água, não fiz amor, logo por aqui não ficarei…non lo creo, pero que las ay, ay!

Luis Gonçalves

Vianatrilhos

Dados do percurso

Informação sobre os aspetos mais significativos:

Data2012-05-19
Tempo de deslocação04h 56m
Tempo parado01h 56m
Deslocação média 3,3 Km/h
Média Geral2.4 Km/h
Distância total linear16.5 km
Nº de participantes25