2010-05-22 Terras de Geraz

Cerca das 08H30 com o dia ameaçando altas temperaturas, nada convidativo para estas iniciativas, saímos de Viana, e rumamos os cerca de 37 caminheiros oriundos de vários locais, em direcção das Terras de Geraz, na expectativa de mais um dia caminhando para melhor conhecer, recantos da nossa região.

O local previamente escolhido para início, foi na freguesia de Geraz do Lima Santa Maria a capela e cruzeiro de S. Sebastião cuja festa se realiza no 4º. domingo de Janeiro.

Tirada a foto de grupo da praxe na escadaria frontal, já com as mochilas nas costas, seguimos através de caminhos rurais em direcção da Igreja Paroquial cuja origem segundo indicações remonta ao séc. XI. Nas inquirições de D. Afonso II, feitas em 1220, a igreja de Santa Maria na qual se venera N. Sra. da Expectação, pertencia a Braga, encontrando-se localizada na “Terra de Santo Estêvão de Ribeira de Lima”. É citada com categoria de paróquia, em 1250. Em termos administrativos, pertenceu em 1839, à comarca de Ponte do Lima e ao Concelho de Geraz do Lima, aparecendo em 1852, na comarca e concelho de Viana do Castelo.

Junto da igreja tanto no exterior assim como no seu interior com a gentileza do seu pároco padre André Torres Costa a servir de guia, visitamos o Núcleo Museológico de Arqueologia, inaugurado em 1991, onde nos foi dada uma perspectiva de todo o seu espólio...

Estes achados agora devidamente expostos, foram encontrados durante as obras de ampliação e restauro da igreja Paroquial. Assim no exterior, entre outros um imponente sarcófago com tampa decorada em “estola” e várias das cerca de 50 sepulturas exumadas do interior da igreja. No interior, anexo à sacristia, situa-se uma sala museológica com peças cerâmicas e graníticas encontradas no local cujas datas se estendem desde a Idade do Ferro até à Baixa Idade Média. Dentro da igreja, e sob o piso de vidro, podem ver-se, no próprio local onde foram encontradas, tês sepulturas medievais. Ainda, se pôde ver na igreja, gravada na pedra a data de 1173, referente, com certeza à reedificação daquele templo.

Mais tempo seria necessário para se admirar todo este espólio, mas o nosso percurso (cerca de 15 km) ainda mal tinha começado. Após os agradecimentos e pedidos de desculpa por não podermos dispor de mais tempo, continuamos a marcha por entre campos de cultivo até ao local da pequena e bem escondida ponte da NAIA, também conhecida por Ponte Romana, por c ma de um pequeno ribeiro que nasce nos montes de Agros, encontrando-se encoberta pela vegetação, talvez quem sabe a melhor maneira de a preservar de “arranjos modernos e destrutivos”. Por aqui terão passado quem sabe muitos peregrinos.

Continuamos a nossa caminhada, por entre pequenos carreiros de lavoura, entrando já na freguesia de Geraz do Lima Santa Leocádia.

Geraz do Lima Santa Leocádia já foi sede de antigo concelho de Geraz do Lima. D. Manuel deu-lhe foral em 1515. Uma particularidade desta terra, eram os seus donatários de entrar aqui com o pé direito descalço. Tal uso biscainho estava consignado no livro das doações antigas.

No monte existem ruínas de um castelo que, segundo a tradição, foi fundado pelos Túrdulos, 400 anos antes de Cristo.
Através de um caminho de S. Tiago atingimos a sua Igreja Paroquial onde á nossa espera estava o seu pároco João Costa Cunha Viana, que aqui se encontra há cerca de 51 anos como Pároco desta freguesia, e que atenciosamente nos serviu de guia.

Santa Leocádia é a padroeira da cidade de Toledo, em Espanha localidade onde nasceu. Deu testemunho da fé durante a perseguição de Diocleciano. Era uma mulher bonita, nobre e possuidora de grande fortuna. Denunciada por ser cristã, foi presa e levada ao tribunal. “Foi interrogada, confessou; atormentaram-na, e Deus concedeu-lhe a coroa”. Depois de torturada, foi lançada numa prisão. Com as unhas, fez Cruzes na parede, vindo a falecer no dia 9 de Dezembro de 304. Os cristãos de Toledo construíram-lhe três igrejas: uma no lugar onde nasceu; outra, no lugar onde foi presa; e a terceira, no lugar onde teve a sua sepultura.

A igreja de Santa Leocádia cujo orago é Sta. Leocádia ecujo ano de construção será séc.XIII (fará segundo parece 1000 anos em 2013), apresenta uma fachada emoldurada por pilastras encimadas por pináculos. Da cornija entre os pináculos, saem as volutas que amparam um nicho. É flanqueada por uma torre sineira, com 3 pisos, e rematada por balaustrada. No seu interior vestígios da sua antiguidade, que nos foi mostrado pelo senhor padre, a quem agradecemos toda a atenção e simpatia na arte de bem receber.

Havia que continuar a caminhar, e para isso após nos despedirmos, rumamos agora em direcção á encosta do Monte do Castelo, cruzando os pequenos lugares de Coscos, Castelo, aqui com um engraçado arranjo popular numa pequena encosta sobre o mesmo, Couces e Paredes, aqui também com uns agradáveis arranjos floristicos feitos pelos moradores. Entretanto a vista para o vale e ribeira Lima enchia de deslumbramento a todos, pois na realidade são vistas muito bonitas e repousantes. Após breve descida atingimos o lugar da Guia, onde no adro da capela com o mesmo nome (local de grande devoção, com festa no 2º. Fim de semana do mês de Julho), e á sombra, fizemos um breve descanso, onde todos se puderam refrescar nas fontes existentes. Daqui a vista para o vale é maravilhosa. Neste local é também gratificante ver como alguns moradores cuidam de pequenos jardins.

Mochilas as costas, protecção solar pois o calor apertava, continuamos agora em alcatrão, passando pelo lugar de Coutada e Ventoso, iniciando já em terra e a meia encosta a subida para o pequeno lugar da Vacaria, pertencente à freguesia de Carvoeiro e diz-se que seria uma antiga Branda do convento de Carvoeiro. Ao longo da subida o sol fazia “estragos” levando a um pouco mais de sacrifício.

Cerca das 13H00, chegamos á Vacaria, e no adro da sua pequena capela devota à Senhora de Lourdes, bem instalados à sombra de um secular sobreiro, fizemos o merecido repouso para retemperar as energias com os respectivos farnéis. Junto, um pequeno fontanário com água fresca, ajudou e de que maneira. A vista sobre o vale criava nesta altura ambiente necessário para o merecido repouso, que durou cerca de meia hora.

Mas o que é bom depressa acaba, havia horários a cumprir, e bem a custo, pois o sol era imenso, retomamos a marcha percorrendo o interior do pequeno lugar, para um pouco mais á frente chegarmos ao lugar de Agros, pertencente a Geraz do Lima Santa Leocádia. Subindo um pequeno escadório visitamos a sua pequena capela, de onde mais uma vez a vista se perde pelo vale de campos em socalcos.

A subida tinha acabado, agora todo o restante percurso seria feito descendo. Através de um bosque de pinheiros eucaliptos e alguns carvalhos, cruzamos a meio do mesmo o regueiro de Agras, chegamos á capela de Santa Bárbara, instalada no monte de mesmo nome e cuja imagem se venera no 1º. Domingo de Julho. Esta capela encontra-se já na freguesia de Geraz do Lima Santa Maria. Toda a zona em redor da capela se encontra em arranjos. Num fontanário novamente se encheram os cantis, continuando a descida, logo atingimos o casario dos lugares de Fontelas, Penagatilha, Calvário, Carvalho da Vinha, sempre com vistas sobre o vale, as freguesias e ribeira Lima. Passando novamente junto da igreja paroquial, chegamos ao final deste percurso junto da capela de S. Sebastião.

Faltava contudo a visita ao Museu de Carros de Cavalos, instalado na Quinta da Bouça em Geraz do Lima Santa Leocádia, para onde nos deslocamos já nas viaturas. Aqui á nossa espera encontrava-se a D. Teresa, irmã da viúva do Dr. Lopo de Carvalho, familiares do Conde de Aurora, que guiou esta nossa visita.

“O Dr. Lopo de Carvalho, médico de profissão, teve como principal hobby, coleccionar carros de cavalos. Ainda muito novo, recebeu de seu avô uma pequena “charrete”, daí o seu grande gosto por este tIpo de carros. Muitos destes carros, foram em tempos utilizados pelos seus antepassados, e +por si guardado e reconstruídos. A presente colecção, é constituída por mais de cinquenta extraordinários exemplares, fabricados em vários países, como França, Holanda, Itália, Espanha, Portugal e Estados Unidos da América, e pelos mais prestigiados construtores, nomeadamente Henry Bbinder, Binder Ainnée, J. Henri Laboudehe, Rothchild & Fils, Peter & Sons, Enrique Vasquez, Almeida Navarro e Niels & Filhos.”

Do valioso acervo fazem ainda parte uma vasta colecção de selas, selins e outros artefactos relacionados com os carros de cavalos. Na sua colecção e entre outras pode-se ver a carroça de Afonso de Bragança, Duque do Porto, conhecido por arreda. Outra é a carruagem Landau de 5 vidros do final do século XVIII, e que serviu para transportar o Marechal Craveiro Lopes e o Presidente António Salazar na inauguração da ponte de Vila Franca de Xira.

Terminada a visita, despedimo-nos da nossa anfitriã, e já com alguma nostalgia, despedimo-nos também uns dos outros, rumando aos locais de origem, esperando ter contribuído para um agradável dia, enriquecendo nossos conhecimentos.
Mais haveria concerteza para ver neste recanto de Terras da Ribeira Lima, contudo fica na nossa memória a forma suave como ao longo do vale se estendem estas freguesias, semeadas de longe a longe com belas quintas com lindos solares nelas colocados, por entre os campos de cultivo bem tratados.

Por agora tinha-se concluído mais uma actividade do grupo de amigos que compõem o VIANA TRILHOS.

“Terras de Geraz do Lima, tão belas, tão mimosas, e tão esquecidas”

Viana 24 de Maio de 2010

Miguel Moreira

Vianatrilhos

Vale de Geraz do Lima

“Bem perto de Viana, e a meio caminho de Ponte do Lima, situadas na margem esquerda do rio Lima, entre a serra da Padela e o Monte do Castelo, encontra-se o Vale de Geraz bastante encaixado no curso superior da ribeira do Lourinhal, alargando, gradualmente, à medida que se aproxima do Lima. Aqui se organizaram as freguesias de Santa Maria e de Santa Leocádia e, já na veiga, a de Moreira, todas elas chamadas de Geraz do Lima.

A sua formação aluvial, aliada a uma boa exposição solar, protecção contra os ventos e abundância de água, faz com que o vale tenha boas condições para a actividade agrícola, com especial relevância para a vinha, a oliveira, o milho e as pastagens. Em contrapartida, nas encostas e partes altas dos montes, desenvolveu-se uma pastorícia que embora privilegie os ovinos e caprinos, alberga também os bovinos, em parte, expulsos do vale por uma actividade que não descura a mais ínfima parcela de terra agricolamente aproveitável.

Foram, certamente, as características atrás descritas que levaram habitantes dos povoados da Idade do Ferro instalados na zona, caso do Castro do Peso, ocupado durante o século I e que fica situado num pequeno cabeço do lugar de Coutada, a nascente da ribeira do Lourinhal.

Foi devido a lavragens e á abertura de covas para se reflorestar este e os cabeços vizinhos, que em 1980 se ficou a saber que o local fora ocupado desde o Bronze Final até um período indeterminado da época romana.

A cerâmica comum da época romana aparece-nos não só na zona do edifício, mas, em maior quantidade, na vertente oeste, aqui juntamente com muita tégula, nos dois cabeços situados a sul deste e na zona dos penedos.

Perante este quadro tudo aponta para que, a partir da segunda metade do século I, a população deixou de se confinar ao espaço intermuralhas, para se expandir para os cabeços vizinhos e, principalmente, para as vertentes voltadas para a ribeira do Lourinhal, com boa exposição solar e abrigadas dos ventos, dando assim inicio á dispersão habitacional tal característica do vale.

Foi certamente do Peso que saíram os primeiros povoadores da Coutada, Perspescoço e mesmo para outros locais do vale como Chouso de Moinhos, Carvalho da Vinha e talvez outros que o nosso conhecimento não abarca”.

In “Proto-história e Romanização da Bacia Inferior do Lima”

Centro de Estudos Regionais de Viana do Castelo – número especial 7/8 1990

Dados do percurso

Informação sobre os aspetos mais significativos:

Data2010-05-22
Tempo de deslocação05h 40m
Tempo parado01h 14m
Deslocação média 2,8 Km/h
Média Geral2,2 Km/h
Distância total linear15.6 km
Nº de participantes37